Carta para navegantes

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mapa de leitura II: a mulher-espera & o homem-viagem

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Carta #20 || das cantigas de amigo medievais a narrativas de autoficção travesti

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Bruna Kalil Othero
nov 30, 2024
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mapa de leitura II: a mulher-espera & o homem-viagem
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Que não venhas, Dionísio.
Hilda Hilst

Bloomington, 30 de novembro de 2024.

I
Roland Barthes, na obra Fragmentos de um discurso amoroso (1977), apresenta a imagem tão tradicional, tão cisgênera & tão heterossexual da Mulher pautada pela ausência do Homem: as tantas Penélopes, costurando e descosturando à eterna espera do retorno de Ulisses, que saiu para conquistar o mundo. Nessa imagem, clássicas tensões dicotômicas: feminino vs masculino; privado vs público; reclusão vs aventura; solidão vs liberdade. O mundo das mulheres é limitado ao corpo e à vida doméstica, enquanto o horizonte a ser desbravado pelos homens é infinito. A partir disso, Barthes cria formulações sobre a relação metalinguística entre texto e tecido — ambos são palimpsestos feitos em solidão que ganham camadas consecutivas por meio da cosedura das linhas. O francês também nota o erotismo solitário de cultivar, ali na intimidade consigo, a lembrança, a saudade e o desejo pelo homem que está distante.

Penélope e seus pretendentes (1912), John William Waterhouse

II
Aplicar essas ideias à literatura lusófona exige maior complexidade, pois é preciso fazer recortes de raça, nacionalidade e classe. A história colonial se baseia em homens europeus invadindo a América e a África, violando mulheres negras e indígenas, enquanto suas esposas brancas permanecem confinadas à reclusão doméstica portuguesa. Dessa forma, a clássica imagem da mulher-espera é muito recorrente em textos portugueses, brasileiros e africanos, muitas vezes reproduzindo o discurso patriarcal — mas nem sempre ela é retratada de maneira passiva e simplista. Cria-se assim uma interessante corda bamba entre endossar estereótipos femininos ou subvertê-los de maneira irônica, humorística e/ou erótica. Afinal, mesmo nos mais antigos textos, há simultâneos diálogos e transgressões com as convenções sociais e de gênero: autores conhecem a tradição, a retratam, mas também a desafiam. Por mais que muitas narrativas sejam centradas no elemento masculino, as personagens femininas também saem por cima e, neste mapa de leitura, ganham mais atenção, como veremos a seguir.

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